domingo, 29 de março de 2009

Renascendo

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Saí para a sacada do apartamento, que fica meio enfiado no meio de tudo, de pijamas mesmo, com o friozinho áspero do finzinho da madrugada mordendo os meus braços, provocando arrepios de frio e o céu a leste com algumas poucas nuvens tingidas de rosa escuro.
E todo o céu foi transitando lentamente, ficando mais com cara de dia e menos com cara de noite, as nuvens próximas se borrando de um bronze intenso. Era lindo.
De repente, eu me enchi de um pensamento totalmente incomum para a fase em que eu estava vivendo, algo que me invadiu com tanta força e certeza que eu não ousei contrariar. O pensamento de que  a vida não é ruim, não pode ser. Nós – e a nossa existência dramática – é que acabamos nos fazendo vítimas de algo que não é inteiramente cruel.
A consciência (e talvez certeza esmagadora) disso e as cores do céu se fazendo e ficando a cada segundo mais brilhantes diante dos meus olhos me deixaram tão absorvida e tão embriagada naquele momento que eu nem sequer consegui pensr em um modo de rezar. Eu não consegui pensar exatamente em qual palavra poderia descrever e expressar completamente aquilo que eu estava sentindo naquela hora. O olhar posto na luz, o tato sentindo a brisa das primeiras horas, os ouvidos ouvindo nada mais que o silêncio absoluto, tão difícil estando em uma cidade movimentada e o nariz sentindo o cheiro da manhã que se formava, numa harmonia completa dos cinco sentidos, sentindo uma coisa só juntos. Naqueles primeiros minutos do amanhecer do primeiro dia do ano, eu entendi que eu estaria feliz com cada simples gesto que eu recebesse a partir dali.

sábado, 21 de março de 2009

Conversando com a morte

morte

Hoje trago uma ilustre convidada, Dona Morte.
Ela falou comigo por telefone diretamente do além para me dar uma entrevista na íntegra sobre o que é verdade e o que é mito em sua carreira milenar:

Dona Morte, como você explica esse medo que todos criaram da senhora?
DM: Veja bem, o ser humano tem toda uma tendência a ter medo do que não conhece e na verdade nenhum deles, nem você mesma me conhece. Aprenderam a me ver como algo ruim.

E você não é ruim?
DM: Claro que não! Eu pareço má nesse exato momento, falando com você?

Não, realmente não parece. Você é bastante simpática e de bem com a vida.
DM: Belo trocadilho (risos). Eu e a vida temos uma relação boa. Ela faz a parte dela e eu faço a minha. Nunca tivemos uma briguinha.

E como você lida com o medo das pessoas quando você vai buscá-las?
DM: Meu trabalho é árduo. Tenho que fazer um serviço rápido e limpo e às vezes as pessoas não colaboram com isso. Acabo ficando com dó de algumas, mas te digo: os pretextos para não morrer são os mesmos há séculos.

Qual foi o pretexto mais engraçado que você já ouviu?
DM: Me divirto muito com os torcedores fanáticos que pedem pra ver um último jogo do time que torcem e principalmente com os mais medrosos. As reações são muito engraçadas, e já presenciei muitos casos em que a pessoa morre de susto.

Sem trocadilhos?
DM: Sem trocadilhos. Eu tenho esse efeito fatal, alguns me vêem e simplesmente caem duros (risos).

 

Pauta para o Tudo de Blog da Capricho: “Quem você gostaria de entrevistar?”

quarta-feira, 11 de março de 2009

Cotidiano

Olhava pela janela, o céu azul acinzentado com nuvens meio

bus

esfareladas pelo vento. Pelo ângulo que olhava, tinha até uma certa beleza, analisando os contrastes de luzes, sombras e cores.
Suspirou, soltando ar e contrubuindo para a atmosfera de cansaço que pairava ao seu redor. Ela mesma não se sentia assim tão cansada, mas acreditava que tanta gente naquele mesmo estado de espírito acabava a influenciando de alguma forma. Tanto que toda a vez que entrava em um ônibus tinha vontade de poder sumir, tamanha a raiva que havia pego daquela atmosfera, aquele ar parado, de todas aquelas pessoas que ela nem sequer conhecia e já tinha um sentimento ruim, era inevitável. Sentiu-se mais pecadora do que nunca naquele momento e ainda assim sentiu a vontade costumeira de descer no próximo ponto e ir andando pra casa.
Distraiu-se com o cenário que tantas vezes já tinha visto de diferentes ângulos. Queria poder sumir, pensou novamente. Afundou um pouco mais na poltrona tentando não calcular quantas mil pessoas teriam sentado no mesmo lugar em que ela estava, seria pior.
Olhou para uma placa luminosa que nunca havia reparado, um dentista, ela supôs. Não enxergava bem de longe, então tinha que ficar com suposições as vezes. Ignorou um moleque que lhe fazia gracejos na esquina de uma rua e rezou para que o semáforo ficasse verde novamente. Se pudesse, mataria todas aquelas figuras que lhe apareciam. Depois ficou pensando desde quando tinha desenvolvido uma mente tão psicopata e irritada. Sorriu de leve, enquanto escondia a risada com uma tossida, para ninguém acusá-la de loucura precoce.
Pensou nas coisas que havia abandonado, pensou em quem tinha a deixado. Levantou-se, pegando suas coisas e vendo se não havia abandonado nada pelo caminho. Desceu daquele antro de melancolia e pensamentos obscuros e proibidos e respirou fundo, como que para trocar o ar mais rapidamente. Tomou seu caminho, olhando pro céu. Era apenas mais um dia, um dia comum em que sua mente divagava absurdamente no caminho para casa.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Invasão

E de wayalguma forma, tudo  vai se ajeitando em seu devido lugar, em seu devido tempo.
As coisas de repente começam a funcionar, os passarinhos tornam-se audíveis novamente, aquela música maravilhosa de boa começa a tocar e quando a gente vê, está cantarolando feliz da vida no meio de todo mundo. Daí pra frente, nos damos conta de que as engrenagens de nossas vidinhas vão voltando aos eixos vagarosamente começaram a girar. Surge a vontade de fazer uma nova tentativa, uma chance de fazer tudo mudar, como um chocolate no fim de um dia ruim para adoçar todo o amargo que ficou na nossa boca.
De repente o buraco negro desvia, o centro do furacão se distancia, a noite medonha acaba e faz um dia de sol daqueles de estontear, e aí dá pra perceber o vento batendo. E assim, pé ante pé, as coisas vão querendo começar a dar certo e não adianta querer ficar forçando, caçando e buscando por essas coisas, elas vem devagar, por elas mesmas, talvez por força divina, conspiração do universo ou porque o mundo gira mesmo.É do nada, não dá pra ficar esperando, porque é outro daqueles acontecimentos que a gente toma conhecimento enquanto abre a porta pra entrar em casa.