segunda-feira, 21 de julho de 2014

Academia

Eu tentei. Eu juro, mais de uma vez.
Mas é como se uma força invisível me carregasse para fora, uma entidade anti-malhação assoprasse contra a minha força de vontade que sinceramente já não era lá essas coisas. E fazendo alguma reflexão, descobri o motivo de não ter me animado a voltar.

No meio do universo dos tênis que parecem uma caixa de lápis de cor derretidos, calças apertadas que parecem obras de arte do sobrinho de três anos e copinhos coloridos a torto e a direito, estava eu, reles mortal, de calça discreta e camisetão largo, tentando fazer com que os olhares não se desviassem dos espelhos que só faltavam cobrir o teto para ver aquele alienígena estranho e... comum.

A academia é um lugar que, para a minha pessoa, parece estar fora do espaço-tempo padrão. Não tenho nada contra quem faz academia, acho bonito quem se dedica a cuidar do corpo e da saúde, o problema é que eu tenho tudo contra os ratos de academia, porque acho que tudo que é demais, vira obsessão. Eu não sei o que essas pessoas fazem da vida, mas das duas, uma: Ou são todos iguais, ou são onipresentes. Não importava o horário que eu adentrasse o recinto, lá estavam eles. Quase desmontando ao levantar aproximadamente 500 kg de peso, com as pernas/braços tremendo tanto e com os rostos tão vermelhos que pareciam que a qualquer momento, ou explodiriam, ou seriam amassados pelo aparelho usado.

Esses seres comem, bebem, dormem e sonham academia. O suor deles deve malhar para ficar forte. Nas redes sociais, a foto do almoço é clara de ovo, aveia e whey sabor manga e a janta é frango branco, mais ovo e banana. Sem contar a batata doce, que é um clássico dos marombeiros. Essa é no café da manhã, almoço, lanche da tarde e janta - aí vai um anti espasmódico de sobremesa, porque o que esse povo deve peidar não tá escrito. A foto do look do dia é quase padrão: a legging com a meia esticada por cima, quase chegando no joelho para as mulheres ou a regata com alças finas mostrando os mamilos para os simpáticos moços com cara de pão amanhecido.

Conversar com essa galera então, é de deixar o queixo cair e empenar de tão surpreendente: Sabem todos os nomes de aparelhos, enquanto meu dialeto parece o de um recém chegado na China. "Aquele aparelho que você puxa para baixo com os dois braços" ou "Aquele outro que faz assim com a perna" (e exemplifico com o movimento). Tirando isso, ainda sabem as calorias de um pedaço de chocolate, receitas com whey, e falam sempre de academia, de seus músculos, de quantos quilos suportam e de quantas vezes na semana pulam o dia de malhar as pernas, porque alguns homens malhados chegam a dar medo de quebrar ao carregarem ombros tão musculosos em cima de perninhas de sabiá desnutrido.

Repito mais uma vez: Não estou generalizando, conto a respeito de alguns tipos presentes na academia. Os maníacos por corpo que não trabalham a mente. Eu não gosto de academia, não me adaptei  e me senti fora do meu ambiente. Se você gosta de academia, eu te respeito e não vou te xingar.

Eu preciso chegar nas frases de efeito, também usadas como hashtag? CLARO que preciso.
Coisas como "Fica grande por*!", esquecendo do verbo no infinitivo, o famigerado TREINO - que eu não entendo... tá treinando pra quê? - e suas mais variadas expansões, como treino insano, TOP e o mais recente, "fibrado" (que dá até medo de procurar a respeito, sério!). Frases de para choque de caminhão ("Que sua inveja vire minha massa muscular" Epa!) , pegar peso até distender músculo, ir faça chuva ou faça sol e ter um corpo malhado como objetivo de vida não estão para a alma que habita esse corpo, que em outra vida deve ter sido criada com uvas na boca e folhas de palmeira para refrescar, eu passo, deixo para quem tem mais #foco. Vou ficar aqui comendo um chocolate, fazendo uma pipoca, lendo livros e comendo bolo, porque quando eu mostrar uma foto minha por aí, estarei com cara de feliz (vide imagem abaixo).


quarta-feira, 18 de junho de 2014

Carta a uma amiga

Oi.

Hoje eu estou triste. Não tenho como não estar, porque você deixou esse plano. Acabou sua passagem por aqui.
Espero que, como você fazia, eu não deixe essa tristeza me consumir por muito tempo.
Não quero escrever nada na sua página do Facebook, estava achando tão lindo aquela corrente de oração e de fé, apostando na sua recuperação e não quero registrar esse momento lá. Opção minha.
Prefiro escrever uma carta, sei lá se deve ser bobeira, mas vai que eu dou sorte e por aí também tenha quem psicografe recados...

Eu só tenho a te dizer que, por mais ou menos três anos eu tive o prazer e a honra de conviver com você, uma pessoa que tinha uma condição um pouco diferente das demais, mas que aceitava suas limitações e que levava a sua vida de acordo com o ritmo que podia, mas que nunca se entregou, nunca deixou que sua fraqueza dominasse o que tinha de forte em você. E me ensinou que aceitar o que Deus coloca nas nossas vidas é a nossa maior oportunidade, porque chorar e espernear não vai conseguir fazer com que nada seja diferente.
Você andava devagarinho, mas dirigia rápido. Uma vez você me falou que era pra compensar a velocidade que você andava. Era essa a sua maneira de encarar as coisas, sempre dando seu jeito.
As vezes, quando a gente ia almoçar no shopping, eu começava a andar mais rápido (costume de querer fazer tudo logo, acho que culpa da ansiedade) e você logo falava "Ei! Dá pra parar de correr?" E eu ria, pedia desculpas e desacelerava o passo, lembra?
Aprendi com você que as pessoas têm limites diferentes, vidas diferentes e entendi que o respeito pelos limites, tanto os nossos quanto os dos outros é imprescindível para vivermos em paz.

Eu lembro que quando eu comprava um carregamento de livros, você sempre ficava mexendo comigo, falando que eu ia encher o quarto e não ia mais conseguir entrar, mas quando eu ficava em dúvida se comprava ou não, você sempre incentivava.
Quando você começou a levar mais livros pra ler no trabalho, eu encontrei um marca página e te dei de presente, porque eu gostava de ver você animada com as histórias. Foi uma coisa tão pequena, mas você ficou tão feliz que parecia que eu tinha te dado um pônei cor de rosa!

Quando eu consegui a bolsa para fazer o mestrado você me deixou uma mensagem de voz tão linda, dizendo emocionada que sempre acreditou na minha capacidade e que eu merecia tudo aquilo que eu desabei no choro, ouvi várias vezes. Agora eu estou com uma ligeira (enorme) raiva de mim por ter formatado o celular e ter esquecido de fazer backup pelo menos disso.

Já tinha uns dias que você não via o sol e hoje, o dia que você deixou sua casca aqui, o dia está engraçado:  olhei lá fora, faz sol e um pedaço do céu está azulzinho, bem bonito, mas um pedaço dele tá todo branco, como se soubesse que o dia tem que ser bonito pra receber você, mas também respeita nossa tristeza.


Eu tenho sido egoísta nos últimos dias, deixei de rezar a Deus pra que Ele exercesse a vontade Dele e pedi só pela minha vontade, de que você acordasse e pudesse sentir o ar entrando nos seus pulmões novos.
Sempre achei você louca por querer arriscar essa cirurgia, acho que até cheguei a falar para você, mas eu nunca te disse que não queria que você fizesse. Mas eu não queria, porque queria você mais tempo aqui com a gente. Egoísta de novo, eu sei. Mas você não pode me culpar, sua presença era agradável, oras!

Eu não queria que você fizesse a cirurgia porque, as pessoas que brincam de deus ainda não têm o poder de decidir quem vai e quem fica e só arriscam. Claro, a vontade é que dê certo, mas ainda é um tiro no escuro.

Não consigo me acostumar com a ideia, saco. É a vida, todo mundo vai morrer um dia, mas não consigo. É como se eu perdesse alguém da família. Fico pensando toda hora que não vou poder mais mandar um vídeo esdrúxulo quando achar e nem qualquer outra bizarrice que fazia você dar risada até cansar.
As vezes eu até me arrependia de te mandar essas loucuras pq vc ficava com falta de ar de tanto que ria. Vou sentir falta de você me mandando dicas de esmalte, das horas de almoço que a gente passava fazendo as unhas e de te encher o saco porque você não comia salada.

Hoje eu estou triste e vou ter que lidar com o vazio que você está deixando. Mas vai passar e eu sei muito bem pra onde você me mandaria se eu me prendesse por muito tempo a isso.
Se alguém merecia o céu e estar cercada de anjos e pertinho de Deus, é você. Ninguém queria que fosse agora, que fosse tão cedo, mas o que me conforta é saber que você vai estar bem.
Mais do que nunca eu desejo que a gente possa ter outras vidas, pra que eu tenha a chance de encontrar com você por aí de novo, só para eu te encher mais o saco e a gente dar mais risada.
E faz um favor pra mim: Suba essas escadas para o céu de um fôlego só. ♥

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Julgamento


Já reparou que você nunca consegue ganhar? Não, não no sentido de que a sua vida é uma porcaria e tudo está dando errado, mas no sentido de que sempre tem alguém por perto para criticar sua vida, suas decisões, seu modo de viver, de se expressar e suas escolhas, principalmente.
Se você procura ver tudo pelo lado bom, você está ignorando o mal do mundo. Se fica triste, é mal agradecido. Se você sorri, deve ser meio besta, se não sorri, que infeliz, que cara de...!

Existem pessoas que parecem fazer parte da sua vida como um júri de provas de fogo, daqueles que levantam as plaquinhas com notas depois da performance. E as notas são sempre abaixo de cinco e os rostos são sempre de uma decepção quase disfarçada. Por que você quer tanto estudar? Por que gosta tanto de ler? Por que quis ir dormir cedo? Sua pressão foi lá embaixo, por acaso você está grávida? E essa alegria aí? Por que tudo isso, menino? Abaixa essa bola que você não tá no topo do mundo, tonto!

Se você é magro e emagrece, deve estar doente, coitado! Por que você emagreceu? Não tá se alimentando direito porque? Mal agradecido, tanta gente passando fome e você ainda fica recusando comida. Como se você tivesse que aceitar tudo que lhe é oferecido porque há outras pessoas passando fome e o desperdício é inaceitável. E se você engorda? Nossa, isso só pode ser ansiedade. Tá com distúrbio? Será que ela se enxerga magra? Cuidado, hein? Gordo morre cedo, nunca é saudável. Se você é mulher, tá grávida (de novo!)?

Tudo é um julgamento. Todo julgamento com base em dados e pesquisas que todo mundo fala, mas que ninguém sabe de onde veio. Sem pensar duas vezes, as línguas se soltam. Tenho um amigo que morreu assim, cuidado. Ninguém pensa se você está realmente com um problema, se está passando por uma fase difícil ou tendo que se adaptar a alguma coisa. "Peguem seus alfinetes, aí vem ela! Vamos espetar até ela ficar brava e aí, podemos dizer que ela está sempre de mau humor!". Palavras amigas se tornam mais escassas a cada dia. Os olhares de reprovação invadem todos os cantinhos da sua vida e aí você começa a pensar que está de fato fazendo tudo errado e quer reavaliar toda a sua vida por conta... do que os outros estão falando.

Melhor parar por aí. Não vale a pena reformular tudo. Daqui a pouco, vai ter outra banca de jurados te avaliando e questionando tudo. A novela nunca muda e é melhor você aprender a fazer suas performances com protetores auriculares ou com fones de ouvido, escutando uma boa música e dançando. Já que vão falar, falem, mas não prometa que vai se importar com isso.