sábado, 24 de outubro de 2009

quereres

 

Aniinha 282

Eu queria ter mais presença de espírito, ser alegre por mais tempo. Queria saber tocar violão, queria ter paciência pra fazer cachos nos cabelos, ou mesmo de cuidar deles decentemente.
Eu queria ser mais bem arrumada, descascar menos a droga da minha unha recém pintada do indicador, porque ela não dura nem uma hora completa.
Queria saber arrumar briga, mas antes queria aprender a dar umas boas pancadas pra pelo menos garantir alguma defesa e ao mesmo tempo queria ser menos bocuda e não xingar tanto no trânsito. Gostaria de me aborrecer menos, de esperar menos das pessoas e de não me decepcionar tanto. Queria eu mesma não decepcionar tanto e não ser tão ridiculamente impulsiva em certos casos. Queria aprender a fazer trança embutida, a não ser tão preguiçosa e aprender as coisas com vontade e em seguida faze-las, ao invés de ficar esperando que se façam sozinhas.
Queria aprender a cozinhar melhor, a aconselhar melhor, a cantar melhor – porque esse é o desastre mais decepcionante da minha vida - a ser uma pessoa melhor e não ter que fazer esforços para isso, que a melhora fosse natural como piscar os meus olhos.
Queria ser mais carinhosa, ser mais atenciosa e enquanto isso prestar mais atenção e não ser tão insuportávelmente distraída em momentos que podem ser cruciais, queria ser mais inteligente e ter explicação para tudo que vai na minha cabeça, mas infelizmente essa praga de massa encefálica é muito mais rápida do que a minha percepção.
E mesmo assim vou, querendo e não fazendo, ou pelo menos tentando em alguns casos, tentando sempre ser melhor mas acabando sempre do mesmo jeito turrão e difícil.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Conhecer a vida

Vou arrumar uma mochila vermelha, encher de porcarias e vou me mandar assim que eu puder. Vou andar sozinha pelas avenidas enormes, uma forasteira desconhecida de todas as faces que lá transitam, assim como todas aquelas faces desconhecerão a minha.
Eu vou me perder em alguma floresta, numa tarde ensolarada. Verei esquilos e pássaros exóticos, e nenhum perigo me circundará. Vou correr em círculos em volta de mim mesma e sempre me encontrar.
Eu vou andar pela guia, me equilibrando sossegadamente, péimage ante pé até chegar em lugar nenhum. Vou vender alguns pertences insignificantes, vou comprar pedaços da história de alguém. Deitarei na grama fria depois do anoitecer e aprenderei toda a transição do céu e das estrelas, saberei o nome e a posição de cada constelação existente.
Voltarei a ver o céu de veludo azul marinho e cheio de estrelas de terras distantes e não vou perder outra vez a oportunidade de fazer uma foto para mostrar para os meus filhos e netos, caso os venha a ter. Se não os tiver, mostrarei a amigos, vizinhos. Verei sozinha, se for preciso, mas não deixarei meus olhos esquecerem jamais daquilo que vi.
Vou deixar o cabelo crescer mais, só pra poder sentir o vento sacudi-los ou bagunça-los, conforme eu ande contra ou a seu favor. Vou sentar na beira de uma estrada de terra e cantar uma canção com a voz e com o coração, olhando para as nuvens brancas no céu, sentindo a brisa encher os meus ouvidos de sussurros de vozes antigas.
Buscarei meus deuses e meus heróis, encontrarei luz infinita. De todas as verdades que aprenderei, a mais forte será a de que conhecimento nunca é demais e a mais absoluta será a de que a vida é bela. Muito bela, e canta uma música tão envolvente que quem se recusa a ouvi-la só pode ser louco.
Eu vou aprender a tocar violão, a fazer contas de cabeça, vou pintar o cabelo de laranja e vou fazer uma tatuagem que ocupe as minhas costas inteiras.
E assim, depois de muito ver, muito ouvir e mais ainda aprender, voltarei à minha casa fechada, a vida renovada e a mente completamente aberta a todas as coisas. A vida vai ficar mais fácil de viver e eu posso estar velha como o tempo, mas terei o gosto de dizer que vivi como eu tinha que viver e que vi muito mais do que um dia achei que fosse possível;